sábado, 23 de agosto de 2008

Daniel

A Ultra Love Cats é uma das festas que mais freqüentei. Sou mais fã da cena alternativa do que da gay. Mas o que fazia desta festa ideal era sua trilha toda voltada para a música pop. Naquela pista de dança já tive vários amores e sorrisos assim como separações e lágrimas. Contar minha historia sem aquela festa seria difícil, assim como contar tudo o que aquelas paredes já testemunharam.
Infelizmente, as coisas no universo mudam e a festa que tanto adorei vem, a cada edição, perdendo um pouco do seu valor, daquilo que costumava ser... Sinal dos tempos ou da falta de senso, mas não quero ficar gastando linhas para falar de defeitos.

'Get up on the dance floor'

A última vez que pisei lá foi no especial “dia dos namorados - Leona Lewis”. Sempre comigo nas baladinhas estavam Henrique, eterno apaixonado (na época namorando), Diogo, Bruno, o pegador que adorava se jogar e Renan, o único de nós quatro que ainda estava no armário. A fila virava o quarteirão, mas estávamos bem posicionados ao lado do carinha que vendia bebida.

“O Diogo não está atrasado?”
“To ligando pra ele, mas ele não atende. Ele tinha me mandado mensagem falando que foi buscar um amigo de metrô. Aliás, esse amigo é pra você, Luis. Ele adorou suas fotos no Orkut”.

Eles sabiam que eu não tava bem naquele dia. A festa já não era legal, estava com raiva do dia dos namorados por passá-lo mais uma vez sozinho e estava com pouco dinheiro pra beber.

“Pra mim? Você sabe que eu odeio encontro arranjado. Não conte comigo”.
“Mas ele é legal/simpático/fofo/interessante...”, no meio da declamação dos predicativos do menino, Diogo aparece ao longe. Com a fila andando acabei por entrar sem ver quem era o tal menino que tinham trazido especialmente pra mim.

Este especial foi marcado por duas “novidades”: 1º rolava uma festa do sinal, idéia infeliz que me lembra as matinês pré-adolescentes. Ironicamente, eu estava de vermelho e mais solteiro que nunca. 2º Tinha uma promoção interessante, em que o casal que desse um beijo na frente do Dj, ganhava um cd com o single “Bleeding Love” e seus remixes.

Vinte minutos e todos entraram e receberam o horrendo adesivo do sinal. Menos o tal menino misterioso. “O nome dele é Daniel, ele trabalha comigo”, Diogo comentou enquanto tirava um vermelho de sua camisa e o colava na calça numa tentativa de deixar aquilo menos ridículo. Quando Henrique viu o tal Daniel entrar, comentou ao pé do meu ouvido: “Amigo, esquece... Ele é muito feio pra você...”.

Pode parecer cruel, mas não tem eufemismo que caracterize fisicamente o Daniel: ele era feio mesmo. Era até fortinho, estava bem vestido, mas não tinha iluminação ou maquiagem que escondesse seu nariz, que estranhamente me lembrou “Alf, o ETeimoso”, mas ele parecia não se incomodar com isso. Disse “oi” para todos e logo já estava interagindo.
“Olhem! O Dj ta ali no canto dando os CDs pra quem beijar na frente dele!”; todos arranjaram pares para pegar o brinde, mesmo sem saber quem era a tal cantora, deixando eu e o Daniel sozinhos. Crápulas...

'espelho, espelho seu...'

Começamos a conversar e ele foi muito educado, com aquele resquício de timidez que dava charme ao que falava. Estava trabalhando pra bancar os estudos, morava sozinho, era assumido. E em todo o momento conversava comigo olhando nos meus olhos, coisa que valorizo muito. Logo, todos voltaram com CDs. Em momentos de dilema como este, prefiro pensar com matemática básica: estou sozinho + ele é interessante – ele é feio = porque não?
E num ato de ousadia peguei a mão dele, sorri e disse “Vamos pegar nosso cd?”.

O DJ Buba estava distribuindo os CDs e ao nos ver ate soltou um “essa eu quero ver...”, and then we kiss... e – droga – ele beijava muito bem.

Assim, passamos boa parte da noite juntos então. Meus amigos ficaram meio chocados, me zoaram e tiraram fotos. Nem liguei. O cara conseguia ser elegante e gentil e tinha uma ótima pegada, o que mais eu poderia pedir? “Rinoplastia”, disse Bruno quando me justifiquei por ter ficado com ele.
Entretanto, no meio da noite, enquanto estava esperando ele do lado de fora do banheiro, duas caricatas saíram de lá e me disseram entre gargalhadas maldosas “bunita, você que me perdoe, mas beleza é fun-da-men-tal!”.
Depois disso fiquei desconfortável a noite toda. Normalmente não penso no que os outros vão pensar, mas de repente pareceu que todos me olhavam e julgavam por estar ficando com ele. Daniel era todo fofo, trazendo bebida pra mim, cantando comigo e até amarrando meu sapato (!). E, na minha cabeça, pensamentos de vergonha por conseguir achar graça ou felicidade com alguém que era feio. Acabou que na ultima hora da festa disse que queria dançar um pouco sozinho...

Quando desligaram o som, saímos o grupo todo pra ver o sol nascer na praia de Copacabana. Estava cansado, desacostumado em virar a noite. Voltamos juntos de metrô, com Daniel segurando minha mão e me deixando dormir no ombro dele o caminho todo, o que só me fez sentir-me mais culpado: ate que ponto o amor gay não é superficial?

O telefone dele ainda está na minha agenda e seu perfil no meu Orkut. Mas, para investir em um relacionamento, acredito que esse sentimento de desconforto nem deva existir. Ou estaria eu sendo superficial?




Para ouvir depois de ler: Leona Lewis – The best you never had.

3 comentários:

  1. Putz...
    Insegurança com a pessoa, eu também sinto com alguns...
    Quando e assim eu nem vou para frente, quero sentir seguro no relacionamento

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  2. ainda acho bleeding love musica de corno...

    bracao.

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  3. Ultra Love Cats! Fui uma vez, quando passei pelo Rio em 2005, ainda no Dama de Ferro. Mesmo febril eu me diverti tanto!

    Não acho que seja superficialidade. Encontros fugidios são assim, você quer algo na superfície. Fosse uma relação diferente, talvez pudesse ser chamado de superficialidade... Mas, mesmo neste caso, o defeito só se mostra porque o envolvimento não é suficiente. Se fosse, o defeito desapareceria...

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