sexta-feira, 28 de maio de 2010

Real ghosts come twice






Às vezes simplesmente você se cansa. Cansa de procurar a metáfora perfeita. Cansa de tentar ver as coisas de modo diferente. Cansa de tentar ser tudo o que quer ser. É quando a vida passa por cima de você. Ou um carro há 70 por hora. É mais difícil digitar com uma mão só, mas definitivamente se tem mais tempo para pensar nas coisas.

Scarface passava na MGM, o único canal a cabo no quarto de hospital. Violência, drogas e Al Pachino como Tony Montana. Absolutamente genial para alguém em recuperação. Gosto quando um filme é tão bom que me faz mergulhar em sua historia. Ou esquecer a fratura na tíbia. Escapismo sempre é um bom analgésico para tudo.

Mas o filme eventualmente acaba e o que fica é aquele vazio, daqueles em que se olha em volta e percebe tudo fora do lugar – vida financeira, vida amorosa, perspectiva de futuro – e começava a questionar o que realmente estava errado nisso tudo: se era eu ou resto do mundo.

Era o ultimo dia ali. Estava esperando a enfermeira entrar para sua ultima checagem. Ao invés da senhora que trocou meus curativos enquanto estava lá, quando na porta se abre um enfermeiro entra. Silencioso, ele pega o prontuário e lê. De alguma forma, seu rosto é ligeiramente familiar, mas minha memória nunca foi boa.

“Sr. Marc. Está tendo alta hoje.”, disse sem levantar os olhos.

“Que jeito sério de dizer que estou livre.”, tentei descontrair. Ele deixou escapar um sorriso ainda mais familiar. Aquilo tudo era muito estranho.

“Pois é...”

“Pode me ajudar a levantar?”

Ele chegou perto e passou meu braço por cima dos ombros dele. Realmente, eu não precisava de metade daquilo para ficar de pé, mas foi uma chance de chegar perto dele. Então inclino meu corpo pra frente como se fosse esbarrar nele e ficar a centímetros de sua boca. Ele fica com a respiração ofegante, mas não como se estivesse surpreso ou excitado. Era difícil de definir da onde vinha aquela tensão. Ele se desvencilha e me deixa cair pesadamente na cama.

“Você não lembra de mim, não é?”

“Você é bem familiar, mas por enquanto é apenas o meu enfermeiro.”

“Um ou dois anos atrás. Saímos de um luau em Ipanema e ficamos juntos...”
esta reticência foi a mais amarga que ouvi. Um nome me veio.

“Matheus?”

Ele assentiu. Saímos juntos umas duas semanas no máximo depois desta festa em que nos conhecemos. Ele definitivamente estava mais interessante agora do que na época que o conheci e não era como se agora eu tivesse varias opções.

“Olha, não vim reclamar a ligação que tinha me prometido ou pedir nada”, ele disse, “Apenas estava curioso para ver você. Sabe o que é mais engraçado? Antes de entrar eu estava fantasiando em como seria esse reencontro. As falas, as reações... Mas agora que estou te vendo eu entendi uma coisa.”

“E o que seria?”

“A gente se beijou, transou e eu cheguei achar que te amava, fantasiava mesmo... mas nunca cheguei a realmente conhecer você... Isso é uma conclusão estranha e por incrível que pareça , libertadora...” , riu-se, ”Melhoras e tenha uma boa vida, Marc.” E fechou a porta atrás de si.

Por cinco minutos pensei achei que era foda ter passado na vida de alguém e marcado deste jeito. Depois vi que era babaquice pensar isso. Na verdade era estranhamente trágico, pois alem de não estar com bem com o que deveria estar eu ainda conseguia ser um completo estranho para pessoas que me amavam. O que é uma pedra para quem está soterrado em problemas?

“Pelo menos não está chovendo”, pensei ao ligar para pedir um taxi.

“Você só achará finais felizes em livros. Em alguns livros.”
Autor desconhecido

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