sábado, 15 de maio de 2010

Salas de espera




Destino. Só paramos para pensar em destino como algo fechado e amarrado quando algo bom que não esperamos acontece. Mas e quando as coisas boas que esperamos não acontecem? Como saber se esperamos acontecer ou corremos atrás?

“E porque você escolheu publicidade?”, perguntou o entrevistador para ganhar tempo.

“Sempre gostei de como as propagandas influem nas vidas das pessoas e quero fazer a minha parte influenciando as pessoas.”, disse mecanicamente. Apesar de o pensamento ser sincero sempre ia com respostas decoradas. Ajudam na hora do nervosismo.

“Mesmo? Deixe-me ver aqui... Marc, não é isso? Estou aqui com o seu currículo... Escola de Bela Artes... tem inglês fluente?”

“e um pouco de francês e espanhol também...”

“Bom, bom... Bem o caso é o seguinte, temos uma vaga de estágio em criação e nesta semana estamos entrevistando os que passaram pela pré-seleção... e você realmente parece promissor.”

“oh, obrigado... Quando posso começar então? rs”

“Gosto de sua animação, mas tenho algumas perguntas antes. Temos de nos conhecer não é?”

Qualquer argüição é sempre meio tensa. Já havia ido a algumas entrevistas, mas aquela era especialmente mais tensa por ser para um lugar onde realmente queria trabalhar. O estúdio estava em expansão e era no centro da cidade com tudo para se inspirar e crescer dentro do meio criativo. Encaixava-se perfeitamente no meu plano. Primeiro passar para uma boa faculdade, arranjar um estágio no meio dela, ser efetivado, comprar um apartamento, abrir meu próprio estúdio, entrar pra história da humanidade, dominar o mundo. Simples não?

“...seis horas por dia, mas tem algum problema sair daqui mais tarde?”, disse o entrevistador já se levantando para me levar a saída.

“Não, acho que não...”

“Ótimo! Maravilhoso! Ainda tenho mais uma entrevista na quarta, mas a vaga é praticamente sua! Pode deixar que te ligo. Eu vou te ligar[...]”

Acho que ele percebeu pela minha reação, mas no momento em que falou esta última frase eu sabia que ele não ligaria. Foi como ver aquele cara na festa pedindo seu telefone quando você sabe que ele não é o tipo que liga no dia seguinte. Não tem nenhuma evidência, simplesmente você sabe que ele não está assim tão afim de você.

Apesar disso ainda mantive um pouco de esperança. Passou a quarta-feira, passou o mês. As outras entrevistas sumiram junto com o telefonema do tal entrevistador. E o desespero da falta de perspectiva começou a bater no fundo da garganta. No quinto dia, já me via na frente do caixa eletrônico vendo o saldo da conta onde o valor mostrado era quinze reais maior do que a conta que segurava na mão. Era angustiante. Não iria passar fome, mas aquele era o momento de apertar o cinto e tentar pensar em saídas para não entrar em cheque especial.

Meu primo me conseguiu um bico como auxiliar de escritório neste meio tempo. O dinheiro era pouco, mas entre ganhar pouco e nada é preferível pagar as dívidas. Eu repetia para mim mesmo que era apenas uma sala de espera para o resto da minha vida. Apenas uma sala de espera.

Meu trabalho se resumia em arquivar e copiar. Às vezes tinha a impressão que nem eles sabiam o que me pediam pra arquivar. Às vezes tinha a impressão que o mundo de copias que me pediam era uma forma de passarem a frustração deles para mim. Mas a luz verde da Fotocopiadora tinha o poder de me desligar de tudo. Algo necessário para viver ali.

Em uma dessas idas a fotocopiadora conheci Ricardo. Ele fazia Gastronomia e aquele também era um lugar transitório para ele. Não prestei muita atenção no resto porque estava mais de olho na tatuagem na panturrilha dele, mas pensando melhor depois o lugar me pareceu um grande hiato para pessoas tentar viver a sua vida. Claro que havia os que gostam de trabalhar lá, mas muitos passavam por ali porque não conseguiram o que queriam para as suas vidas. Então o que fazer quando as coisas não acontecem do jeito que a gente quer no momento que a gente quer? Estava tudo certo, eu estava preparado para estagiar, era o meu momento, mas simplesmente não aconteceu. Era um caminho certo e de repente não é mais.

Enquanto saia do trabalho não conseguiria pensar em outra palavra para definir esse meu estado atual que não destino. Só podia ser destino que fizesse com que alguém com mais preparo pegasse justamente a vaga dos meus sonhos. Era destino que me colocou na sala de espera onde todos os outros esperavam a sua chance. Era destino que fez com que o motorista daquele carro resolvesse atender o celular no exato momento em que eu estava atravessando a rua.

Continua...


"Esquecer é uma necessidade.A vida é uma lousa,em que o destino,para escrever um novo caso, precisa apagar o caso escrito."
Machado de Assis


6 comentários:

  1. Eu estou na sala de espera agora.

    E particularmente sei como é tudo isso, inclusive estar com a conta na mão para pagamento olhar o saldo e ver essa situação.

    No meu caso, sou uma pessoa de muita fé, mas acho que aacbei repousando demais nisso enão correndo atrás de meus objetivos.

    O remédio? Acho que é não desistir de sonhar e de lutar nunca!

    NUNCA!

    "Nossa maior fraqueza está em desistir. O caminho mais certo de vencer é tentar mais uma vez"

    Thomas Edison

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  2. A minha impressão foi que coisas que aconteceram comigo aconteceu com você. Eu não sei ao certo a quem culpar por meus planos terem descido ladeira abaixo, mas eu também decidi que não vou me permiti sofrer. Talvez as coisas irão acontecer em seu determinado tempo ou não. Eu sei de uma coisa: vou lutar at´pe chegar onde eu quero.
    Espero qeu tenhas sorte em tudo que pretendes fazer.bj

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  3. Gostei muito do seu jeito de escrever.

    E também estou na sala de espera. Na verdade ter um objetivo em mente é o que me dá forças para continuar.
    Concordo com o SAM, desistir jamais!

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  4. sai da sala de espera já...
    mas ainda sinto a palpitação das incertezas...

    e isso é bom! :)

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  5. posso estar enanado
    mas sinto que o "continua" termina com uma segunda parte de final feliz. =)

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  6. Odeio cliffhangers!
    Fico tenso, ansioso, louco pra saber o que vem pela frente! hehehe

    Sobre a sala de espera, é uma coisa esquisita realmente. Eu acho que realizei tudo aquilo que planejei pra mim. Fiz a facul, consegui o emprego, sou bem remunerado por ele.
    Mas sabe o que sinto? Que escolhi a sala de espera quando poderia ter sido ousado e optado por algo que não me fosse tão confortável, mas que me desse mais prazer. Será? Não sei.

    Por isso vou investindo em outras áreas, procurando fazer coisas que me dêem prazer. Afinal, a minha conta não tá no vermelho. Mas eu tb não faço aquilo que me deixe totalmente realizado.

    Abraço

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