sexta-feira, 27 de março de 2009

Raw

"A diferença entre o amor e o sexo,
é que o sexo alivia as tensões
e o amor provoca-as."

Woody Allen







A campainha toca. Eu jogo o desenho que estava fazendo no canto e vou ate a porta. Já sei que é o Edu, apesar de ele estar atrasado. Ele entra com sacolas de mercado, a maioria com bebida para que nos divertíssemos no final de semana juntos.

“Olha, eu ate gosto de cozinhar, mas como pretendo não sair da cama então comprei comida congelada e...” ele para de falar quando passo a mão nele. Ele fica tão bem de jeans que não me contento só em olhar.

“Você está me molestando, é isso?”

“... é....O que você vai fazer?”




É tudo tão automático que o pensamento passa longe. E eu consigo o beijo que eu queria desde o começo da semana. As peças de roupa vão caindo, a temperatura aumentando e nem saímos da cozinha. Só de sentir a pele dele em contato com a minha eu já me excito. Os beijos começam a ficar agressivos, se tornam chupões, mordidas. O tempo já não faz sentido, só queremos sentir agora. Nessas horas mesas viram apoio, cadeiras viram suporte para tudo o que puder imaginar. Pernas para o ar, gemidos, e finalmente estamos um dentro do outro. É a loucura, é o suor. Somos dois, somos um. E inauguramos o primeiro cômodo da casa.

Ficamos alguns minutos no chão da cozinha ate que as forças voltassem para que fizéssemos algo para comer. Edu gostava de cozinhar então foi direto para o fogão. E enquanto eu tirava as roupas do chão, minha consciência veio a toda pra cima de mim. Não usamos lubrificante. Não usamos camisinha. Logo eu que sempre fui tão prevenido sobre sexo, me deixei levar pelo calor do momento e, como a expressão diz, ‘andei no cavalo sem cela’.



“Eu sei que você está preocupado, mas por favor não fique.”, disse ele por cima do ombro, de costas para mim.

“Eu sou tão obvio assim?”

“Um pouco, mas é porque eu também estava pensando nisso...”

“Nisso?”


“O que acabamos de fazer.... Eu sei que é bom sem o preservativo e eu sei que você não tem problema nenhum assim como eu não tenho, mas acho mais seguro para nós evitarmos, sabe como é...”

“É, eu sei... é só que eu... eu nunca tinha transado sem camisinha. Sempre fui do tipo que se preocupa com esse tipo de segurança e sempre disse não para isso... “

Ele veio ate mim, abaixou ate a minha altura e me deu um beijo na testa. “ Amor, a gente vai se cuidar nas próximas, relaxa. O final de semana está apenas começando...”

E enquanto eu terminava o trabalho que estava fazendo e esperava o almoço, comecei a pensar. O sexo não foi ruim sem o preservativo, foi tão bom quanto. Mas porque eu tinha essa imagem tão feia do que tinha acabado de fazer? Digo, meus pais para terem procriado tiveram obrigatoriamente de ter transado sem camisinha e, pelo que sei ate hoje, eles se amam e confiaram um no outro para fazer isto. Este era um passo lógico que um casal dava ou nos anos 80 não havia preocupação de se cuidar usando camisinha? Parece que antes do fantasma da Aids o amor podia seguir o que os instintos falavam e depois dela tudo não passou de preocupação. Especialmente para os gays. Apesar dos preconceitos quanto ao ‘câncer gay’ terem ido abaixo, acho que se espera que sejamos sexualmente irresponsáveis e acabemos doentes. Tudo isso faz do sexo sinônimo de preocupação e como alguém pode gozar no final com preocupação na cabeça? Simplesmente não dá!


É um fato que não se pode ignorar a realidade de doenças e problemas que existem. É o maldito século 21, fazer o que? E como crias do século onde sexo tem de ser consciente eu sei que usar o preservativo não é apenas um sinal de zelo, mas de carinho. Se previne não somente aquele que não quer pegar doenças, mas aquele que pensa pelo seu parceiro e foi isso que vi no beijo na testa que Edu me deu.




Infelizmente minha época prega o divertimento responsável, mas não é por isso que vou deixar de me divertir. O resto do final de semana teve segurança, mas teve muito, muito mais diversão...








Para ouvir depois de ler: Placebo – Nancy boy

terça-feira, 24 de março de 2009

A chave do armário – Parte II: portas quebradas

“My name is Harvey Milk
and I'm here to recruit you.”
Harvey Milk







Armário é um espaço onde o que é nosso fica guardado. Para algumas coisas temos orgulho de usar e mostrar, mas para outras reservamos o espaço do fundo dele para que fiquem fora da vista de todos. Pensando deste jeito a expressão ‘sair do armário’ se torna algo bem mais universal do que o conceito de simplesmente ‘se assumir gay’. Sai do armário o gordinho que manda o fortão se fuder e diz que é feliz comendo. Sai do armário a moça que fala para os pais que está grávida mas que vai ter o bebê porque ser mãe solteira é o seu sonho. Sai do armário a viúva que nem deixa o corpo do falecido esfriar e apresenta o novo boy para as amigas. “Dá licença que agora é a minha vez de ser feliz.” E no final de tudo, é por isso que quebramos as portas e as janelas da vida, para que apesar do consenso geral de felicidade a gente saia em busca da nossa própria.




Este não é um texto do tipo ‘destruam seus armários’. Porque assim como a verdade liberta ela tem as suas conseqüências e cada caso é um caso. Algumas portas depois de abertas nunca mais se fecham. Outras levam à precipícios. Mas na grande maioria das vezes imaginamos algo muito pior do que realmente tem do lado de fora. E pode ser incrível reação das pessoas a sua volta quando elas conhecem você realmente. Foi o caso da historia que comecei a contar no último post. Tudo me foi contado, e em todo momento a minha vontade era de interferir nela, chegar para a família do meu namorado e gritar que estávamos bem e felizes e que aquelas voltas não iam levá-los a lugar nenhum. O que me segurou foi saber que são nestas voltas que damos em nós mesmos que percebemos a verdade sobre as pessoas.
[...]



Cena 1: O dito pelo não dito

Dona Carminha, minha sogra, entra em casa e se joga cansada no sofá. Liga na Márcia Goldschmidt e deixa que a televisão a veja. Seu rosto está inchado e os olhos vermelhos. Eduardo ao ouvir a porta bater sai do quarto e encontra a mãe olhando para o vazio, sentada no sofá.

“ Tudo bem, mãe? ”, perguntou o filho preocupado.

“ ...tudo, menino, tudo... ”, respondeu a mãe ainda lagrimejando.

“ Não parece que ta tudo bem. Aconteceu algo? ”

“ Não, não tem nada para acontecer... ”, ela limpa a nariz e fecha a cara, ressentida.

“ Pelo amor de Deus, mãe. Aconteceu algo de errado? ” “Não, por quê? Você fez algo de errado para que eu ficasse chateada?”, disse olhando duro para ele. Levantou e saiu antes que o filho pudesse responder.





[...]

“Eu não entendi, meu bem. Ela podia estar chateada com varias coisas... trabalho, dinheiro, sei lá...”, perguntei quando ele me contou.

“Lu, não é assim. Ela ficou a semana toda bronqueando comigo. Agora ela está dando estas indiretas. Acho que alguém contou a ela. Podem ter nos visto sair daqui de casa ou no shopping... não sei... mas acho que ela estava chorando porque falaram algo para ela.”

“Ok. Então porque não conversa com ela abertamente? Coloca as cartas na mesa, ué... Se ela já sabe, é melhor colocar tudo em pratos limpos antes que algum problema aconteça.”

“Não sei... nós nunca tivemos este tipo de conversa, sabe. Não sei como falar da minha intimidade com ela... Eu nunca precisei.”

“Então a idéia é deixar as coisas como estão ate que alguma merda aconteça e vocês joguem a verdade na cara um do outro?!?”

“Basicamente, é isso...”


Cena 2: Ligando os pontos

Na frente de um computador, Camila entra no perfil do orkut do seu irmão, Eduardo. A mudança de status de solteiro para namorando veio junto de uma foto tirada em um shopping com ele e um menino sorrindo com a inscrição: ‘a vida é cheia de surpresas’. O que chamou a atenção dela para a sua pesquisa virtual foi uma curiosa ligação do seu outro irmão, Antonio, que não estava entendendo as fotos que encontrou no celular do Junior, onde depois da foto do sorriso no shopping, os dois meninos se beijavam. Ela deixa um recado: ‘Tá namorando é?!? Depois quero conhecer!!!Bjs’

[...]
“É um fato, Luiz. Todos na família já sabem.”



Cena 3: Filmes, pizzas e verdades

Dois dias depois do recado, Camila foi levar seus filhos para visitar a avó. Os meninos entraram pulando e brincando na casa e Dona Carminha chamou-os para ajuda-la fazer um bolo. Sozinhos na sala Camila e Edu tentam finalmente conversar sobre o assunto. Cochichos daqui e dali e a mãe sai para ver o que estão falando e fecha a cara novamente. “Mãe, a gente vai dar uma volta para alugar um filme para os meninos, ok?” Saíram com aquela desculpa para poderem conversar. E tudo ficou bem. Camila contou da ligação do irmão e que já desconfiava. Edu disse que estava feliz e que era bom ver que os irmãos respeitavam isso. Mais tarde Camila tentou conversar com a mãe sobre, mas ela não quis comentar o assunto. Ela estava em negação.



Cena 4: it’s Friday, i’m in love.

Saindo do estágio na sexta, Eduardo vê 13 ligações não atendidas em seu celular, todas de casa. Imagina o pior, um acidente ou algo assim e liga para lá imediatamente. Sua mãe atende aos prantos e respira aliviada ao ouvir a voz do filho. Alguém ligara para a casa dizendo que o havia seqüestrado e que queriam um resgate, quando na verdade o celular dele não tinha sinal dentro do laboratório. Ele disse que estava saindo da faculdade e estaria em casa daqui a pouco.
Ao chegar em casa, a mãe o abraçou mas a recíproca não foi verdadeira. Ele estava frio com ela.
“Viu, não tem do que se preocupar. Eu estou bem.”, disse secamente. Se direcionou ao quarto para guardar suas coisas.

Sua mãe parou na porta, ainda abalada com o trote pela possibilidade de ter perdido seu filhinho caçula.

“Você esta chateado comigo?”

“Não, mãe. Estou apenas sendo um espelho de como sou tratado aqui.”

Ela segurou o choro e foi para o seu quarto, onde desabou. Foi muito para Edu. Ele sabia que ela estava abalada ainda e não era legal a sua atitude. Foi no quarto dela e eles se abraçaram. Não foi necessário que falassem mais nada. Apenas aquela ação disse tudo o que precisavam. E as coisas voltaram a ficar bem na casa dele.



Enquanto lutamos por respeito e direitos na sociedade, nos esquecemos de que a nossa volta existem pessoas que queremos muito bem, mas que podem sentir o mesmo por não conhecer você realmente. E enquanto a mentira for contada, seja para auto preservação, seja para que se evitem dores, você nunca poderá dizer que foi realmente amado. Porque aqueles que nos amam querem nos ver felizes, mesmo se aquele não for o seu ideal de felicidade. Para isso portas e janelas são quebradas a todo o momento. Algumas com gritos, com lagrimas, com palavras ferinas. Mas poucas vezes pensamos que elas possam se abrir com um simples ato de bondade. Não é o mais rápido ou o mais eficaz, mas é o mais honesto. Ser verdadeiro com você para ser verdadeiro com o mundo. E quando estiverem prontos para serem felizes, algumas portas simplesmente abrem sozinhas.






“Dá licença que agora é a minha vez de ser feliz.”




Para ouvir depois de ler: Jonas Brothers – Lovebug

quinta-feira, 19 de março de 2009

A chave do armário – Parte I: Portas trancadas


"There's nothing like a first kiss. "
Drew Barrymore como Lucy em
Como se fosse a primeira vez








Queria começar pedindo desculpas pela demora a postar. As coisas andam complicadas, dinheiro mesmo, sabe. Nada de drama novelesco desta vez. O negócio é focar no trabalho e sair do cheque especial. Mas o que mais me deprime em ver minha conta no vermelho é ter de me limitar pela falta de grana. Sempre aparecem eventos legais ou ate mesmo uma saída simples com o namorado que acabam por ficar complicadas quando se conta ate o ultimo centavo. Como medida de emergência econômica – isso porque o cartão novo do Edu também ainda não chegou – passamos a nos encontrar na casa um do outro.

Edu não morava sozinho. Ele dividia um sobrado com a mãe, uma enfermeira. E como toda profissional da saúde ela passava muitas horas fora de casa, então no decorrer da semana era quase comum eu passar na casa dele antes da faculdade. Entretanto, a ausência da minha sogra não era o ideal apenas para que ficássemos mais a vontade, e sim por que Edu não era assumido para a família. Isso me espantou no começo dado a naturalidade dele quando estávamos juntos, mas com um cotidiano feliz vai reclamar destas pequenas coisas por quê? Eu não queria ser apresentado para a sogra mesmo, pelo menos não agora.




Os dias passaram e começamos uma interessante rotina de casal. Eu saía de casa com minhas coisas da faculdade e ia para a dele, transávamos de manhã, estudávamos a tarde e trabalhávamos a noite. [...] Obviamente essa condição não se sustentou muito. Na última quarta-feira quando já estávamos nos vestindo para sair para a faculdade, ouvimos algo na porta. “Edu, acho que tem alguém entrando...”; “Calma, calma. Será que é a minha mãe? Ela só volta a noite... Bem, fica no quarto que eu já volto.” O ‘calma, calma’ não foi pra mim, foi para ele mesmo porque eu não me exaltei. Na verdade, já tinha visto aquele filme com o A. várias vezes. Quem já ficou escondido atrás de geladeira para que a irmãzinha do namorado não o visse pelado sabe do que eu estou falando. Então, terminei de me vestir calmamente e peguei um trabalho que tinha tirado para mostrar a ele. Se aparecessem no quarto, diria que era um amigo da faculdade estudando com ele. Simples. Mas quando termino de fechar a mochila, ouço uma chave na porta do quarto. Uma chave trancando a porta.




Na hora meu pensamento foi o de que “isso não pode ta acontecendo”. Sentei na cama e esperei como pai que espera o filho no escuro para surpreendê-lo ligando o abajur quando ele entrasse. Poucos minutos e a porta se abre. Edu entra furtivamente e sussurra que era seu irmão mais velho, que estava se separando da esposa e voltaria a morar lá com eles. Disse para que esperasse um pouco e saísse porque ele tinha entrado no banho. Minha cara era de alguém visivelmente puto, mas decidi que não fazer a cena ali. Se assumir para a família já é difícil suficiente sem um escândalo.

Fiquei esperando no corredor ate que ele aparecesse e saíssemos de lá. Paramos numa praça sem se olhar, sem trocar uma palavra. Ele encosta na minha mão e eu tiro.

“Desculpa...”, disse com uma voz pequena.

“Olha, eu nem sei por onde começar a falar... Certamente esse foi o tipo de atitude que eu não esperava de você e...“

“Lu, eu não fiz por mal. Eu fiquei nervoso, foi isso... eu... eu nunca tive namorado antes. Um garoto pelo menos. E esse tipo de situação é totalmente nova para mim, eu não sabia o que fazer...”

“Eu sou o seu primeiro namorado?!?”

“Awn... é... Você é o primeiro em varias coisas... mas eu sei que o que eu fiz foi errado. Sei que isso vai contra a tudo o que eu digo e faço e que eles são minha família e vão ter de me aceitar. É só que nunca tinha sentido necessidade de falar ate agora. Mas se quiser vou lá falar com meu irmão, minha mãe e quem for e colocar isso logo em pratos limpos...”

“Edu, calma não é assim.”, segurei a mão dele, ”Não tem como saber como sua família vai reagir e eu não quero que faça isso só por que eu peço. É muita responsabilidade para mim. Esse é o tipo de atitude que muda a vida de uma pessoa e se você o fizer vai ter que ser por você.”

“Eu sei, amor. Mas é algo que eu sei que já deveria ter feito. Eu sempre brinco com este ou aquele amigo que o armário não faz bem a ninguém, sempre falo para dizerem a verdade, mas minha vida é uma contradição do que eu falo. Eu tenho o meu próprio armário e preciso enfrentá-lo.”

“Qualquer que seja a sua decisão, saiba que eu estou aqui com você e vou segurar a sua mão sempre que precisar. Mas não faça nada precipitado, ok?”

O final dessa conversa foi algo mais brega, claro. Mas é amor, fazer o quê. Alias nessa historia toda, a atitude dele foi o que me surpreendeu. A primeira coisa que fiz quando o problema apareceu foi ligá-lo a uma ex historia mal terminada. Ele por sua vez, viu que a atitude dele não foi boa comigo e que algum dos seus problemas afetariam nossa vida e que ele teria de mudar. Quantos caras têm esta percepção? E ao ver o final diferente daquela infame historia, o final que eu queria ouvir, percebi o cara incrível que estava comigo. Nesta hora que vi que pessoas diferentes levam à finais diferentes, que sempre existe uma chance para o final que você quer se der espaço para ele acontecer e que é possível sim se apaixonar de novo por uma pessoa.

E os problemas financeiros? Ah, nem lembro mais deles...







[ Epílogo ]

Às vezes, não sempre, o destino se encarrega de dar um empurrãozinho para solucionar os problemas. Quem pode dizer é Antonio, o irmão mais velho de Eduardo. Ao procurar pelo número da pizzaria no celular do irmãozinho, ele achou bem mais do que estava esperando...





Para ouvir depois de ler: Kelly Clarkson - My life would suck without you

sexta-feira, 13 de março de 2009

Pontos de discórdia entre pessoas cordiais

"I want to be alone.
I think I have never been so tired in my life."

Greta Garbo





Quando comecei o namoro com Edu tive uma preocupação com relação aos meus amigos. O que acontece naturalmente depois que se começa a namorar é querer momentos sozinhos com o seu amado, o que acaba criando uma distância com aqueles que sempre estiveram com você. Fabio e Henrique, meus melhores amigos, conheceram o Edu na mesma noite em que ficamos a primeira vez e sempre torceram bastante por nós. Mas a verdade é que apesar da saudade deles eu não estava mais animado para baladas e madrugas de bater cabelo. Como ponto de concordância para que pudéssemos nos ver e saber das ultimas noticias depois de três semanas sem se ver marquei um happy hour. O lugar escolhido foi o ‘Um oito oito um’, charmoso restaurante no coração comercial do Rio. É certo que também queria fugir dos 40° C que fez a semana toda e beber uma gelada. Sendo assim, liguei para o Edu e disse que ia ter uma noite com os meninos.

Fábio é o primeiro a chegar. Atrasado, claro. Entra apressado no restaurante com um óculos gigante e desaba na cadeira ao chegar à mesa.

“Desculpa a demora. Ok, vamos falar. O que acontece com este calor? São 18 horas e eu estou su-an-do!”

“Infelizmente, meu bem, sudorese faz parte do charme carioca. Mas se acalme que já estamos no ar condicionado.”

“Santo foi o inventor desta maravilha moderna! Já pediu a primeira rodada?”


Junto com o primeiro copo ele me contou o verdadeiro final da saga de X. E o final, o verdadeiro final, aconteceu depois do episodio do copo na boate, onde os dois já sóbrios, limpos e com menos raiva um do outro sentaram para conversar. X vinha de um relacionamento difícil e queria liberdade, mas ao mesmo tempo estava bem só com Fabio. “E também se namorássemos provavelmente ia traí-lo por tédio, sabe. A falta de compromisso mantém a emoção”, finalizou. Naquela altura não sabia se incentivava, falava para ele mudar ou não comentava nada. Por sorte, Henrique adentra naquela hora e me poupa de uma decisão depois da terceira cerveja.

“Está atrasado, hein...”

“Desculpa, desculpa. Passei o dia na praia de Ipanema com amigos e tinha de passar em casa para trocar de roupa antes de vir pra cá... o que estão tomando?”

Outro ponto que preferi não me pronunciar na hora: a Praia. Antes de mais nada eu digo que sou avesso a elas, especialmente as cariocas. Não porque elas sejam feias – na verdade o por do sol mais lindo é em Ipanema - mas é que todas as praias tem famílias barulhentas e crianças cagando na areia e as áreas reservadas ditas ‘gays’ tem sempre um quê de social-depois-de-balada. Detesto famílias suburbanas na praia. Detesto sorrir e acenar para pessoas que querem apenas mostrar seu biceps. Detesto areia na sunga também. Por isso mantenho minha cor de nada com proteção fator 50 e meu velho wayfarer.




Fabio fecha a cara para Henrique quando ouve ele dizer Ipanema.

“Está acontecendo algo que eu não to sabendo?”, pergunto.

Era a quinta cerveja quando ele explodiu: “Ai, muita coisa. To com muita coisa na cabeça. Alem do meu ficante ser um idiota que parece ter 15 anos, do meu salário não ter previsão de sair e eu estar trabalhando sem receber nada para poder garantir meu emprego, os meus ‘amigos’ [fez aspas com os dedos] me deixaram sozinho tomando conta de uma barraca de praia com as coisas deles, enquanto eles ficaram 2h fora, brincando e se divertindo.”

“O quê? Ainda isso? Eu já pedi desculpas!”, Henrique bate na mesa.

“Conta essa historia direito...”

“Fomos a praia na minha folga ontem, eu, Henrique, Rogério e Alan.”

“Quem?”, ta a historia começa já com personagens novos que eu não tinha idéia quem eram.

“A moça sentada a minha direita [Henrique], o namorado dele, e um ex meu que vive sem nada para fazer e eu chamei para ir...”

“Você está namorando?!?”, minha memória seletiva a la Dori excluiu o resto e focou na informação faltante. Porque eu era o único a não saber de nada? E principalmente porque eu pareço ser o único que trabalha durante a semana toda?!?

Henrique sorri amarelo e diz “Surpresa! Bem, eu comecei anteontem na balada... e ”

“Ah, Luis, você continua não sabendo de nada..." interrompeu Fabio "deixa eu continuar... Enfim, o que aconteceu foi o famoso "vamos ali, é rápido." E eles voltaram acho que... 2h depois. E eu lá sozinho. Aí a mulherzinha que estava na minha frente, puxou papo porque viu que eu tava sozinho. Oh que legal. Um belo jeito de se curtir uma praia com os amigos, me abandonaram com uma gorda de biquíni!!”

“Pêra, quem é essezinho que está namorando? Como se conheceram?”

“Você o conheceu também... ele é aquele ex do Fabio que caiu de paraquedas na festa...”


“Odeio quando vocês trocam ex e não me atualizam... e porque deixaram o Fa sozinho na praia?”

“Foi apenas um mal entendido fomos no posto porque o Alan queria ir ao banheiro.”, justificou esfregando as mãos culposamente.

“Não podia ir na praia?”

“Não, não para o que ele queria...”

“E porque foram vocês dois com ele? Ele precisava de ajuda?”

“Ah, não podia perder a chance de um banheirão com o Rogério... namoro recente, sabe como é...”

“urrr...Acabei de vomitar um pouco na minha boca só de pensar nessa visão... A conta por favor!!!!”



Sou Amy-casa-de-vinho




Saímos de lá para outro bar porque o nível alcoólico é inversamente proporcional à salubridade do lugar em que estamos bebendo. Logo, saímos de lá e caímos na Lapa. Já era noite, mas o movimento ainda era pouco. Passamos o depósito, o arco íris e finalmente chegamos ao local: Sal e Pimenta. Lembro que só entrei no lugar porque eles disseram que havia videokê e eu poderia cantar Maysa. Acabei com Vambora da Calcanhoto, porque não tinha Amy no repertório. Em horas como essa que vejo que quando bebo eu não faço o mínimo sentido. Mas estava me divertindo. Terminei minha musica sem levar tomate ou qualquer outro vegetal, então tava bem. Continuei a explorar o lugar, que não era tão ruim afinal.





Quando era meia noite, saímos do lugar cantando e mexendo com as pessoas na rua. Normalmente sou bem tímido, mas como o A. costumava dizer “Luis, quando você bebe você vira Amaury Jr.” Então como ninguém queria voltar para casa, pegamos um ônibus e fomos parar em uma boate da vida, que juro que não lembro o nome. E não, eu não deixei meu batom no cinzeiro como na musica da Gaga. Na verdade eu estava resistindo um pouco à idéia de entrar no lugar. Era a cena. Era a musica bate estaca e a luz negra. Eram as travas e os paetês. Era o vazio emocional de uma pistade dança cheia que eu queria evitar. Mas eu entrei, por eles. Eram amigos e eu já tinha pagado o mico da noite. Entramos e ficamos a dançar perto do bar. Semi-conhecidos começaram a aparecer. O que eu estava fazendo ali? “Nossa, você ta sumido, hein...”, “Você não mudou nada...”. Era um pesadelo de pessoas que se achavam intimas. Fui ao banheiro fugir daquilo tudo. Lavei o rosto e como um fantasma atrás de mim Gabriel, um ex namorado meu, aparece. Ele não acredita ter me achado ‘naquele lugar aleatório’. Eu sorrio amarelo fingindo não ter morrido de susto com ele parado atrás de mim. Começamos uma conversa desinteressante e nem sei o que falo, só balanço a cabeça sem reparar no que ele esta dizendo. Eu só queria sair dali. Com um aceno eu tento sair fingindo que alguém me chama, mas ele segura o meu braço. ‘Não, deixa eu te pagar uma bebida!” e me puxa para o caixa. Eu puxo o braço de volta. Na hora, como se Mr. Hyde assumisse o lugar do Dr. Jekyll, o rosto dele se distorce em uma expressão de sarcasmo e ele diz:

“Jogo duro, você? É, eu bem que ouvi por ae que você estava namorando serio... Cadê ele mesmo?”

Eu senti asgo do ser desprezível que achava que eu era um qualquer da noite. Mas ele estava errado?, falou o grilo falante. De qualquer jeito dei um soco na cara dele e saí da festa. Já tinha bastado da noite para mim. Mas saí culpado. Realmente estava na festa e Edu nem imaginava. Me senti a pessoa mais escrota do mundo não sabendo me controlar tanto por ter ido lá como por ter agredido o imbecil na boate. Como por reflexo, puxei o telefone e liguei para o ele. Bebida e celular, uma combinação perigosa. Mas se era para contarem para ele algo distorcido, contava eu a verdade. Eu estava nervoso também, não sou de bater nas pessoas.

Comecei a falar e falar e falar e ele:

[Ele, preocupado]“Amor, tudo bem, não tem problema... você falou que ia sair... me diz onde você está agora?”

[Eu, Bêbado e gritando ]“Eu to no meio da rua de... sei lá... só que eu precisava te contar... [repete a historia]

“Lu, pelamordedeus ai é perigoso! Podem te assaltar!”


“Foda-se ninguém vai me roubar! Roubar o que? Esse celular é velho mesmo!! E vem vindo um táxi, vou me jogar na frente para ele parar...”

“Luis Carlos, não faz isso!”

“Não, ele parou antes nem precisei me jogar...” [troca as pernas-cai do salto]


“Garoto, me liga assim que colocar os pés em casa.”, desligou.

Acabou que eu estava a duas quadras da minha casa. Entrei liguei para todos que não ficassem preocupados e me joguei na cama. Conciliar amigos e namorado requer recursos alem do que o meu espírito possui. E as coisas terminam como a gente imagina? Claro que não. Maldito Murphy.

Mas não queria mais pensar. Não queria mais pensar em nada ate a tarde da semana seguinte.








Para ouvir depois de ler: Shakira – Estoy Aquí

segunda-feira, 9 de março de 2009

Orgulho e Preconceito

"Todos os caras mais gostosos são gays."
Paris Hilton



Domingos são dias mortos naturalmente. É o primeiro dia da semana e é aquele em que se deveria descansar para começar a semana bem. No último foi o dia internacional das mulheres, apesar disso. Parabéns às leitoras, aliás. Eu sei que elas mereciam muito mais que um tapinha nas costas, mas o meu dia me mostrou um outro lado que talvez não merecesse ser comemorado.

Já de saco cheio do domingão do Faustão, decidi chamar Edu para ir ao cinema. Fomos ao Nova América, um shopping que fica perto do terminal do metro. Já na fila percebemos o caráter progressista do local, com pelo menos dois casais gays de mãos dadas, o que nos deixou menos tensos a qualquer reação homofóbica. Assistimos ‘Watchmen’, divertido até, mas como já falei aqui não sou bom em criticas de filmes. Deixo isso para o Cinema Homens e Pipoca . Logo depois de sair da sala, procuramos uma mesa na praça de alimentação para conversarmos e bebermos.

Dois copos de chopp depois e já estávamos com nossas conversas filosóficas de mesa de bar quando do outro lado do shopping uma menininha feliz passava com sua família. Nós não estávamos nos agarrando, nem sequer nos beijando, apenas conversávamos, mas dava para reparar que éramos íntimos pela nossa proximidade. A grande maioria olhava e parecia não se importar. A garotinha não. Ela devia ter uns sete anos e com toda a dramaticidade infantil apontava para nós, colocava a mão na boca simulando uma risada e fazia seu show. Edu estava de costas e não viu no começo, mas com a minha visão ‘privilegiada’ do espetáculo eu comecei a ficar seriamente puto com aquilo.



Era a garota, mas não era só ela. Era a ignorância na vida de uma menina que não era diferente da população do mundo que viveria a vida toda se importando com as diferenças dos outros e se incomodando com o que não tem nada haver com a sua vida. Era o pai que a impedia de apontar, mas olhava para trás e incentivava a discriminação e provavelmente ensinou a ela que ‘aqueles veadinhos não não iriam para o céu’ ou qualquer baboseira homofóbica sem fundamento. E ao mesmo tempo em que sentia raiva pela atitude escrota da menina – a qual repito que na minha opinião a culpa é toda e exclusiva dos pais que a ensinaram que isso é ‘errado’ ou ‘doente’ – eu sentia pena dela. Pena de um ser que vai viver a vida na ignorância a não ser que a vida de um tapa na cara dela e diga para ela deixar de ser escrota. Ok, talvez eu esteja um pouco alterado, mas no fim das contas eu não fiz nada contra a menina. Mesmo depois de ela vir na nossa mesa e perguntar porque estávamos encarando ela. Eu pensei em mil e uma respostas malcriadas, mas escolhi a milésima segunda: continuar sendo feliz e deixar a garota se rasgando de raiva.

Isso ficou na minha cabeça por alguns dias, mas a vida tem de continuar.






Para ouvir depois de ler: Garbage - Bleed like me
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É com certo atraso que agradeço ao Douglas do Proud Brasil por mais uma selo, o Troféu Amigo, um selo ‘para blogs que são extremamente charmosos. Esses blogueiros têm o objetivo de se achar e serem amigos. Eles não estão interessados em se auto promover.’



Meus indicados são:

1. Gay alpha
2. Branco Súbito
3. 3 sem tirar
4. G cliché


Parabéns a eles!